Um ensaio sobre a cesariana: mães, como todas as outras

Um ensaio sobre a cesariana: mães, como todas as outras

Um ensaio sobre a cesariana: mães, como todas as outras

Sobre a cesariana dizem-se muitas coisas: que é um caminho fácil, procedimento de eleição de quem pode pagar para evitar passar pelas horas e pelo sofrimento que o parto natural supõe. Sobre as mães que têm os seus filhos por cesariana também se diz muito: que são preguiçosas, que não são mães a sério, que não amam os seus filhos da mesma forma porque não enfrentaram a dor para os ver nascer.

Sobre a cesariana não se fala da inevitabilidade da escolha (muitas vezes, a cirurgia é a única via possível), das cicatrizes que o corpo e a mente abraçam, da recuperação que se prolonga no tempo. Sobre a cesariana não se fala da solidão invasiva, das expectativas que as circunstâncias destroem, da ofensa à natureza que o organismo sofre.

O parto normal é, como indica o nome, o processo esperado. É também uma benção. Exige um esforço monumental, mas cumpre as leis para as quais fomos programadas. As mulheres que o enfrentam são guerreiras, fortes e poderosas, podem abraçar os filhos no momento em que os ouvem chorar, experimentam sensações que se deduzem únicas na vida de qualquer mãe.

No entanto, as mulheres cujos partos acontecem por via cirúrgica são-no também. As complicações existem e a medicina também – para as contornar. Mesmo quando a cesariana é uma opção, em nada esta via desmerece uma mãe; se estão reunidas as condições e há confirmação por parte de um profissional de saúde, a ninguém cabe o direito de definir um procedimento como desnecessário.

Não podemos desmerecer as mulheres que, sozinhas, contêm as lágrimas depois de dezanove infrutíferas horas de trabalho de parto, e entram numa sala impessoal, com médicos indiferentes, para receber o filho numa realidade que contraria meses de expectativas.

Não podemos criticar nem ofender as mulheres que, depois de um procedimento cirúrgico, têm força para embalar o choro de uma criança, se levantam de uma cama sem lamentos, evitam espirrar e tossir durante semanas em defesa da dor.

Não podemos, mesmo, apontar o dedo às mulheres que não viram o filho nascer, que perderam esse momento de ligação emocional profunda, e que, com mais ou menos intensidade, recebem ainda assim as crianças com uma promessa para a vida. O clique dá-se depois.

Não podemos julgar as mulheres que, querendo ou não, arriscam as vidas para fazer nascer outra – o primeiro de todos os sacrifícios que farão enquanto mães.

Não podemos olhar de lado para as mulheres que sabem escolher aquilo que sentem ser melhor para a sua saúde física e mental, que tomam decisões pensadas, que abraçam as cicatrizes como prova de amor.

Não podemos fechar os olhos à verdade de muitas destas mulheres: se a recuperação demorar um pouco mais, há um bebé que não sente o contacto pele a pele, que bebe leite de fórmula contra o exigido pela mãe.

Podemos, e devemos, praticar a empatia, o entendimento, engolir o julgamento precoce para com outras mães. Porque o são – mães como nós, com sentimentos e dúvidas, incertezas e sentimentos de culpa. Não os agucemos.

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