Os miúdos têm direito à opinião? - Pumpkin.pt

Os miúdos têm direito à opinião?

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Saiba como estimular a opinião própria dos seus filhos.

O direito à opinião é um dos mais difíceis de conceder aos nossos filhos, que tantas vezes tentamos moldar à nossa imagem. Ao mesmo tempo, os adolescentes parecem reprimir os pensamentos e não os partilham com os pais, ávidos por entender o que se passa nas suas cabeças. Rita Castanheira Alves, a Psicóloga dos Miúdos, explica-nos como resolver este problema comunicacional e incentivar os miúdos a formar e dar a sua opinião. 

Numa consulta, um adolescente, cheio de ideias, muito expressivo e que gosta de falar da vida e do que sente, acabava de me dizer que não costumava falar assim com os pais. Questionei-o porquê, se tinha tantas ideias e gostava tanto de reflectir e debater assuntos. Encolheu os ombros e disse-me que quando tentava sentia-se desvalorizado, criticado e normalmente sentia que a opinião dele era posta na área da opinião dos «putos», que não sabem nada da vida. Por outro lado, eu já tinha assistido ao contrário nesta família: o adolescente não dar a opinião dele e os pais, impacientes, queixarem-se de que não tinha opinião para nada, que não pensava nem queria saber de nada.

Claramente, havia um problema de compreensão e de comunicação entre estes pais e este filho adolescente. Ele tinha opiniões, até bastantes e fundamentadas, vontade de as dar, mas recebeu mensagens contraditórias, que o fizeram recuar e optar por não partilhar o seu ponto de vista. Naturalmente, as mesmas reflectiam a idade, a fase e as experiências individuais, e essa contextualização é essencial para aceitar e interpretar a opinião do adolescente.

O direito à opinião é isso mesmo, um direito. Não é um dever, mas também não é uma proibição, como se se fosse demasiado novo para o fazer. As opiniões de cada um e o jogo de confronto entre diversas perspectivas são um ensaio para a vida real, de preparação para lidar com as diversas perspetivas. A aceitação do outro e a definição dos valores, crenças e perspectivas do próprio são essenciais para a construção da identidade.

O direito à opinião inclui duas dimensões essenciais: escutar e aceitar.

Escutar passa por atentamente e empaticamente ouvir o que é dito, dedicar atenção e silêncio quando o adolescente expõe a sua perspectiva e não simplesmente ouvir.

Aceitar é o início fundamental para um caminho de confronto de perspectivas, aceitação recíproca, respeito pelo outro e eventualmente modificar opiniões ou integrar novos dados nas informações já assimiladas, o que pode provocar mudanças efectivas, ou não. Sem escuta efectiva e aceitação, dificilmente o adolescente sentirá vontade de dialogar, reflectir e ter a sua opinião. Se sentir à partida crítica, desvalorização ou desprezo pela sua opinião desistirá facilmente e será assim vedado um espaço fundamental de crescimento em família, de reflexão, construção de valores, crenças e, eventualmente, mudança de comportamentos e atitudes.

Se, por outro lado, se sentir excessivamente pressionado para ter uma opinião, ter de a expor sempre, ter de a apresentar devidamente fundamentada, irá provavelmente optar pelo silêncio e pela ausência de partilha de opinião, o que poderá levar inclusivamente à opção de não reflectir.

Internamente, há uma vida cerebral que contribui intensamente para que, mais do que em qualquer outro momento, a opinião tome um lugar importante para o adolescente.

Em termos de maturação cerebral, na adolescência assistimos a um aumento do pensamento lógico, a uma mudança através da qual o adolescente se torna capaz de avaliar, reavaliar, confrontar informação nova com a antiga e por isso reformular ideias, questionar-se e, por vezes, assumir uma postura quase existencialista.

É a fase em que se interroga o que lhe foi transmitido e o que sempre vivenciou, juntando-se a isto o questionamento da sua própria existência. É uma fase de manifestação de novas opiniões, contraditórias com frequência às dos pais, até então os principais interlocutores na passagem de informação, da transmissão de valores e da moralidade.

Cabe aos adultos, não perdendo de vista a idade, os acontecimentos cerebrais, a fase de desenvolvimento do adolescente e as suas características, permitir que a opinião seja dada, tida em consideração, e, num jogo entre a aceitação e a reflexão, ajudar o adolescente a chegar à possibilidade da reconstrução do que pensa e sente ou do seu quadro inicial de referência ou de valores.

Um jogo em que o adulto não deve deixar de ser o adulto, que respeita os limites e as competências emocionais do adolescente, não criticando excessivamente as opiniões mais contraditórias, não o deve levar ao limite no questionamento e na argumentação das mesmas.

É um jogo essencial para o desenvolvimento social e o estabelecimento de boas relações sociais e para a construção da personalidade do seu filho.

Como posso ajudá-lo a gostar de opinar? — Auxiliares de opinião

  • Ofereça-lhe livros diversos;
  • Diga-lhe ou escreva-lhe numa mensagem uma frase existencialista ou uma questão para reflexão;
  • Recorte pequenas notícias ou curiosidades do jornal e deixe-lhas na secretária;
  • Proporcione a interacção com pessoas diferentes e com contextos e filosofias de vida diversos;
  • Convide-o para verem filmes variados, documentários, biografias ou filmes históricos que promovam reflexão e dilemas;
  • Partilhe com ele os seus ídolos e inspirações;
  • Aproveite os conteúdos programáticos de filosofia ou doutras disciplinas para lançar temas de conversa e a partilha de opiniões.

O que devo saber? — Ingredientes suplementares mas essenciais

  • Em situação alguma obrigue o seu filho a ter uma opinião. Assim é que não a terá mesmo;
  • Faça mais perguntas do que afirmações;
  • Use perguntas abertas, evitando o estilo inquérito fechado de sim e não;
  • Manifeste sempre uma atitude empática e curiosa;
  • Cultive o direito à discórdia e a aceitação da mesma;
  • Promova em casa o confronto de perspectivas diferentes e a aceitação das mesmas entre os adultos;
  • Peça opinião em situações e decisões mais banais, não guardando só a opinião para decisões muito complexas;
  • Esteja preparado para que o seu filho possa discordar de si e assumir posições muito diferentes dos conceitos e valores que lhe foram transmitidos ao longo da infância;
  • Não assuma como um ataque, crítica pessoal ou provocação, quando a opinião é muito contrária ao seu quadro de valores e de moralidade;
  • Lembre-se das opiniões que foi tendo ao longo do seu crescimento, de quais mudaram e as que se mantiveram;
  • Não evite temas ou não proíba que se possa conversar sobre tudo.

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