Desafiámos a Sofia dos Pais com P grande, a propósito do Dia da Mulher, a falar de como podemos educar as nossas filhas para que venham a ser mulheres poderosas, auto-confiantes, que não aceitem limites ou estereótipos.
Este texto lindo, poético e verdadeiro, foi a sua resposta (que nós adorámos!):
Fala-me de ti filha, quero-te ouvir. Gosto de ouvir as coisas que tu dizes, e de ler as coisas que tu escreves. Gosto de adivinhar o que vais dizer, antes mesmo das palavras te saírem da boca. Interessa-me saber de ti. Interessa-me saber sobre o que fazes. Tenho interesse em tudo o que te diz respeito. Respeito tudo o te interessa. Respeito tudo o que tu és. Prometo respeitar tudo o que decidires ser.
A propósito do dia internacional da mulher… Faz hoje doze anos que enchi a mochila com o nada que tinha em Portugal, e me atirei num avião com destino a Londres. À minha espera tinha nada. Não falava a língua, não tinha trabalho, não conhecia ninguém. Nesse dia fiz-me mulher. Já contei esta história à minha filha muitas vezes. E vou contá-la tantas outras, sem temer o pó que se acumula na repetição, sempre com a convicção de que é uma grande história. Porque foi no decorrer desta história que me fiz mulher.
Muitas vezes me perguntam se faço ideia do que a minha filha vai fazer quando crescer. Muitas vezes me dizem que ela vai fazer algo grande. E na grandeza desses bons desejos, eu escondo com timídez o meu encolher de ombros, de quem não passa muito tempo a pensar no assunto. Não tenho qualquer aspiração para a minha filha, mas que ela se torne uma mulher feliz. Que seja livre para escolher, e que nessa liberdade amadureça as suas escolhas. Que saiba festejá-las ou fazer-lhes o luto quando necessário. Desde que ela nasceu que lhe sussuro ao ouvido “sê nada mas apenas tu mesma”. Uma mulher que sabe o que quer, e que salte para o ringue da vida sem medo de sofrer danos. Uma mulher que saiba curar os danos, e vê-los como aprendizagens, e renascer mais forte por entre elas. Uma mulher que se respeite-sempre, muito- e se dê ao respeito-sempre, muito. E com toda a sinceridade, repito a mim mesma, e a quem me quiser ouvir: não me interessa nada se ela vai escolher ir para a universidade e ser médica, ou deixar a escola para ser au-pair nos Estados Unidos. Não quero saber se ela vai querer namorar um advogado de sucesso, ou um acrobata de circo desempregado. Quero apenas que ela encontre um homem que a trate como o pai dela me trata a mim. Quero apenas que ela vista a roupa que a faz sentir bem. Quero apenas que ela se rejubile no corpo que lhe cresceu por debaixo dos sonhos, e que deixe os sonhos guiarem-lhe o coração que lhe bate no corpo. Quero que ela seja ela, e que ela seja nada mas feliz.
Hoje, dia internacional da mulher, celebro a liberdade que tive para ser uma, e a liberdade que dou à minha filha para ela o vir a ser. Celebro a escolha que fiz, quando decidi que aquele homem ia ser o pai dela (e uma filha acaba sempre por procurar um homem como o pai que a criou). Celebro a mãe que é amiga, a filha que amiga é, e que nenhuma de nós queira alguma vez inverter a ordem natural dos papéis. Celebro as conversas sem tabús, os segredos bem guardados, as opiniões sem tom de critíca, as discussões, as confissões, os amuos, as desculpas sentidas, as regras que não abdico. Celebro os anos que já passaram por nós, e os anos que estão por vir. Celebro o que ela diz, o que ela pensa, o que ela sente, porque é na soma desses algarismos humanos, que ela encontrará a força e a confiança para ser ninguém mas ela própria. Celebro o tempo-e o tempo é tudo- que lhe dou nos dias de hoje, e que vou ter tempo para lhe dar sempre. É nesse tempo que ela vai crescer, que ela vai amadurecer, e fazer-se mulher.
Daqui a vinte anos vamos as duas jantar fora e celebrar sermos mulheres. Vou verter a garrafa do “vinho vermelho” que tu sabes que eu tanto gosto, no teu copo alto. Vamos brindar. Vais sorrir-me e olhar-me nos olhos, e eu vou apenas dizer-te:
” Fala-me de ti filha, quero-te ouvir. Gosto de ouvir as coisas que tu tens para me dizer…”
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