O Pai é Pop e a Mãe é Rock!
Ao longo dos próximos meses, vamos desvendar histórias de famílias que nos motivam e inspiram no nosso dia-a-dia. São famílias que ousam fazer diferente, que têm a coragem de desafiar os padrões e que vão sempre à procura daquilo que as faz feliz.
As famílias que nos inspiram tiram o melhor partido da vida, gozam cada momento e divertem-se juntas.
São histórias diferentes, bonitas e originais, que esperamos que vos inspirem também!
Há quem se refugie no mal que sofreu para justificar o mal que pratica. Marcos Piangers contrariou a tendência: nunca teve um pai presente, mas tornou-se “o pai mais cool do Brasil”. Com os seus textos, vídeos e palestras, lembra-nos que o mais importante numa família é estar. E ele está – com Ana, Anita e Aurora.
A 12 de junho de 2003, Dia dos Namorados no Brasil, a rádio em que Marcos Piangers e Ana Emília Cardoso trabalhavam viu uma nova onda ser sintonizada: a sua. O dia pode parecer, aos ouvintes mais cépticos, um cliché; mas, como em tudo, pode também ser considerado um início romântico e promissor – principalmente por ter conseguido estender-se no tempo.
Três meses depois de começarem a namorar dividiram casa e planos. Agora, quinze anos passados, partilham conquistas: têm livros publicados, fazem a sua voz chegar longe – literalmente a outros locais no mundo, com as suas palestras e publicações na internet – e encaminham Anita e Aurora, as duas filhas, na construção de uma vida equilibrada. Esta é uma familia onde “O Pai é Pop”, a “Mãe é Rock” (e às vezes Punk!) e as filhas… uma Orquestra de descobertas.
A história podia ter-se repetido, mas a negação é mais forte
Marcos Piangers não conhece a vida como quem conhece um pai. Foi forçado a crescer no limbo entre a imaginação e a realidade, a luta da mãe para o criar e as dúvidas naturais de quem procura entender a sua própria história. Talvez pareça mais lógico, confortante até, pensar que foi nessa ausência que escavou os fundamentos do pai que hoje é. Marcos nega-o.
Fazem-me muito essa pergunta; se me esforcei tanto para ser um bom pai, ou um pai presente, porque eu não tive pai. E a resposta que eu normalmente dou é “não”. A percepção que eu tenho hoje em dia é a de que se eu tivesse um pai participativo e amoroso, que servisse de referência, eu ter-me-ia desenvolvido melhor como homem, como marido, namorado e como pai também.
Todos os dias que eu fiquei em dúvida, perdido com relação à paternidade ou ao casamento, ou mesmo com atitudes tipicamente masculinas, faltou-me uma referência para justamente saber o que fazer naquela situação.
A sua construção foi por isso uma caminhada em tudo menos fácil. Hoje, Marcos é descrito pela imprensa como um “exemplo”, um “guru”, um “especialista” em paternidade. É “o cara”: aquele que parece passar, através dos próprios gestos, dos textos que escreve, das conferências TED que chegam a mais de 60 milhões de visualizações, e dos livros que publica – “O Pai é Pop” já vendeu mais de 250 mil exemplares – um pouco do que é ser um pai moderno, criativo, inovador, justo, verdadeiro.
As mulheres já descobriram uma realização pessoal na capacidade de buscar a sua liberdade de escolha. As mulheres encontraram caminhos para não se limitar apenas à maternidade. Hoje em dia a mulher está no mercado de trabalho e muitas casas são sustentadas por mulheres. É importante que o homem faça o caminho contrário, o caminho inverso, o caminho de uma reconstrução da sua masculinidade com a possibilidade de ser sim um cuidador afectuoso, amoroso, atento e participativo.
Criar filhos é missão tanto do pai quanto da mãe e o pai não pode se furtar dessa responsabilidade… e nem dessa delícia. Porque isso é algo que não nos contam: cuidar dos filhos, criar nossa família, é uma delícia, uma felicidade, uma realização – tanto para mulheres quanto para homens. É importante que o homem descubra essa realização.
Essa realização não está isenta de desafios, como os enumera Ana.
Quando temos um só filho, temos que cuidar para não mimá-los; quando temos dois ou mais é muito difícil fazer que todos se sintam amados, pois estão sempre disputando atenção.
A “falta de tempo” é, para tantos, uma distância profunda entre pais e filhos – para Marcos, é mais uma realidade mascarada, uma justificação pouco sustentada, uma história sobre uma sociedade obcecada por três questões centrais e que acaba a esquecer-se de se focar naquilo que realmente importa. E isso passa por saber equilibrar a atenção que cada filho pode exigir de forma diferente.
A nossa sociedade é obcecada por consumo, e portanto tem que ganhar muito dinheiro para comprar coisas: carros melhores, apartamentos melhores, brinquedos melhores, viagens melhores.
A nossa segunda obsessão é por estar sempre ocupados. Temos uma tremenda dificuldade de estarmos sem fazer nada. O próprio termo “desocupado” tem uma conotação pejorativa no Brasil; significa que a pessoa é malandra, relaxada, não tem nada o que fazer. Mas a desocupação é importante. Pesquisas cientificas atrás de pesquisas científicas comprovam que é importante o ócio, a capacidade de estar sem fazer nada. Tendências como o mindfulness, a meditação, a capacidade de você realmente estar onde está, vão contra essa nossa obsessão de estar sempre correndo, preocupado, em outro lugar que não esse onde de facto se está.
A nossa terceira obsessão é com tecnologia. A tela do celular toma hoje boa parte do nosso tempo. Dizemos que não temos tempo para nada mas temos bastante tempo para ficar no Facebook discutindo questões bobas. Temos bastante tempo para ficar até às 3h da manhã curtindo fotos no Instagram. Temos bastante tempo para jogar Candy Crush enquanto estamos no banheiro.
Dizemos por aí que não temos tempo para nada. Mentira, não temos é prioridades. Se você realmente ama sua família, se ama seus filhos, e entende a missão que é criar um ser humano completo com afecto e limites, com futuro, é importante que você assuma a necessidade de estabelecer prioridades.
Eu costumo dizer que nenhum pai é o melhor pai do mundo para todas as crianças. O melhor pai do mundo para um filho pode ser o pior pai do mundo para outra criança. É importante que nos especializemos nos nossos filhos e descubramos maneiras de sermos cada vez melhores para eles, para que eles cresçam mais completos, com noção de vida em sociedade, respeito, educação, e se sentindo amados, com afecto, carinho e amor. Porque essa é a única forma de melhorarmos a sociedade, de criarmos uma sociedade menos neurótica e obcecada.
É que um Pai, para ser Pop, precisa de muito tempo dedicado aos filhos. Uma vez eu li um livro chamado “Antes de Partir” que dizia que os principais arrependimentos das pessoas eram ter vivido uma vida de aparências e ter trabalhado demais. Esse é um erro em que eu não quero cair. Eu busco questionar essas obssessões sociais e questionar essas armadilhas, para que eu não caia nelas e possa ter uma boa vida.
A força feminina no equilíbrio de todas as coisas
Ana Emília Cardoso é uma mulher inteira – dentro do seu coração cabem ideias infinitas, projetos imensos, um formigueiro que a impede de parar. Nascida em Curitiba, Ana não se define numa frase, menos numa palavra. Não é um nome, uma profissão e uma paixão: é tantas. É jornalista, escreve para Revista Pais&Filhos e tem três livros publicados. É mestre em Sociologia Política e feminista. É mãe, companheira e viajante em família. É fundadora do projeto cultural Bonne Chance, trabalha na start up Canal Bloom e é integrante da Casa da Mãe Joanna. Faz podcasts como eco da rádio que um dia lhe ocupou os dias. E tenta, sempre, ser melhor – mesmo sabendo que certos conceitos são utópicos.
Ao lado de Marcos, e depois de Anita e Aurora nascerem, percebeu e reforçou a ideia do quão importante para uma mãe é ter o apoio presente e constante de um pai com quem dividir e a quem delegar tarefas. E, por isso, Ana sublinha que a igualdade existe e reforça-se nos gestos.
Cobra-se muito das mães como se nós não fossemos pessoas frágeis e sujeitas ao cansaço. Um pai que aprende a dividir tarefas logo não precisa mais que a mulher delegue nada. Ao lavar a louça, preparar lancheiras ou colocar as roupas na máquina de lavar, os homens entendem que estas tarefas não se fazem sozinhas.
Parece simples, até óbvio, mas a rotina mostra-nos que a sociedade ainda nega esta igualdade. Marcos assume que um pai vive preocupado quando sabe que terá como missão no mundo orientar duas filhas mulheres.
Preocupa-me colocar no mundo as duas pessoas que eu mais amo sabendo que elas sofrerão algum tipo de diminuição ou violência por simplesmente serem mulheres.
É importante entendermos os nossos machismos diários, o nosso comportamento violento e a injustiça que é limitar o potencial de uma pessoa simplesmente por ela ter nascido de um determinado sexo.
Acredito que é diferente educar meninos e meninas mas é o papel de todos os pais permanecerem comprometidos com uma sociedade mais justa e igualitária. É importante que os meninos aprendam desde cedo que não existe coisas que só eles podem fazer e nem coisas que só as meninas podem fazer. São prisões limitadoras em que as crianças muitas vezes são colocadas: as meninas não podem jogar à bola, vestir de azul, brincar com carrinhos; os meninos não podem usar rosa, não podem dançar ou mesmo cuidar de um filho.
Lá na frente, temos meninos que não brincaram com bonecas, e que não foram incentivados a ser pais, a ter filhos e em alguns casos a abandonar esses filhos. E noutros casos, a ter filhos e a permanecer dentro de casa mas sem participar. Isso é profundamente preocupante.
É diferente educar um menino e uma menina – parece ponto assente. E é por isso que Marcos tem o cuidado, natural, de colocar honestidade nas suas partilhas: ao quebrar os preconceitos, ao ser um homem a falar de paternidade e, sobretudo e sempre, de amor, está a tentar mudar o mundo em que vivem as suas filhas.
Acredito que vivemos uma época em que é permitido “re-discutir” os conceitos de homem e mulher, os conceitos de família, os conceitos de sociedade. Tudo o que temos ao nosso redor foi inventado por alguém.
Foi inventada a ideia de que o azul é a cor dos meninos e o rosa é a cor das meninas. Foi inventada a ideia de que todas as meninas são princesas e que todos os meninos são aventureiros e exploradores. Foi inventada a ideia de que meninas fazem ballet e os meninos jogam futebol. É importante que a gente possa ter a liberdade de reinventar a sociedade de forma mais igual, respeitosa, justa, igualitária, e também amorosa.
A mãe de Marcos é uma figura central, inquestionável, omnipresente e sagrada na sua vida – quase como Deus. Criou-o, sustentou-o, educou-o, encaminhou-o e é a primeira das suas referências maternais. Não foi só de Eloísa, ainda assim, que o papai bebeu os ensinamentos que o tornam, também a ele, uma referência hoje. Esse crédito dá-o a Ana – e, consequência desse amor, a Anita e Aurora também.
Foi um trabalho árduo o da minha mãe, o de me educar, mas o meu contexto levava-me sempre a comportar-me de uma maneira tóxica, com uma masculinidade que não condiz com um estilo de vida saudável, portanto a minha masculinidade teve que ser redesenhada no momento em que eu casei e tive as minhas filhas.
As minhas filhas então me ensinaram que homem chora, sim. Que homem sente, que homem é sensível, que homem tem instinto maternal, que homem tem a capacidade de cuidar e de ser respeitoso, paciente, que o homem não é simplesmente o provedor e o pagador de contas.
Marcos esteve, por duas vezes, próximo de perder a mãe. É uma realidade que o assusta, mas do qual consegue, também, absorver sentimentos bons.
Em 2010 a minha mãe teve um acidente e eu quase a perdi; ela ficou em coma por 15 dias, e depois em 2014 descobriu um cancro. Então esses são momentos que você se lembra do que realmente importa na vida. Em finais do ano passado a minha irmã descobriu um cancro, também na mama, e todas essas questões nos fazem sempre buscar significado naquilo que está acontecendo e valorizar aquilo que a gente tem de melhor: nosso afecto, nossa união, nosso carinho, nossa coragem, nosso amor.
A minha irmã disse-me uma coisa muito bonita: tudo o que o cancro trouxe de ruim vai passar, mas tudo aquilo que ele trouxe de bom na nossa vida – as pessoas boas, essa união que a gente criou, as oportunidades que a gente viu para se ajudar – tudo isso vai ficar para o resto da vida.
A Família é uma Orquestra
Surpreendidos com o sucesso e o impacto que as histórias da sua família têm nos outros, Marcos e Ana esforçam-se por blindar Anita e Aurora da exposição pública da sua esfera privada.
Não imaginávamos que tantas pessoas se iam identificar. Conversamos de tempos em tempos sobre essa exposição e sempre relembramos que o mais importante é a nossa relação, a nossa construção familiar, e tentamos que a fama, o assédio, as fotos, e a badalação, os convites e os presentes não nos deixem cegos para o mais importante, que é a nossa formação completa, a nossa capacidade de estarmos sempre realizando nosso propósito de vida: melhorar o nosso entorno mas principalmente melhorarmos nós mesmos como pessoas.
O mais importante é perceber a sintonia entre todos, para que a orquestra de diferentes estilos musicais, gostos, personalidades e vontades siga afinada. Nesse sentido, Marcos e Ana entendem-se na perfeição. É a jornalista quem define, de forma tão simples e palpável, os papéis, fixos e móveis, de cada um.
Um pai pra ser pop tem que dar banho, levar na escola, contar história e estar sempre por perto. Tem que ter energia pra valer: para viver a sua vida, criar os filhos e dar um suporte para a esposa também. Tem que ter abraço para todo mundo. Uma mãe é rock quando admite para si mesma que não dá conta de ser boa em tudo. Que a perfeição não existe. A mãe é punk quando entende a adolescência e consegue se manter calma e orientar os filhos mesmo que tudo a sua volta pareça estar em chamas.
É a adolescência, aliás, quem se aproxima a passos largos da casa desta família, uma assombração encarada com humor, antevista por Ana no seu livro “A Mãe é Punk”. Anita tem 12 anos e o período em que mais vezes se cava um fosso entre pais e filhos escancara-se nas suas realidades.
A adolescência dá sinais de fumaça – mau humor, sono, má vontade -, à nós cabe entender que não é pessoal, que é físico e tentar ajustar a comunicação e as cobranças para não prejudicar o relacionamento e criar responsabilidade. Falando assim, parece fácil, mas pode ser bem desafiador. Eles nos tiram do sério e nós não podemos esquecer que somos o modelo, logo, temos que ser sempre racionais e ponderados. Afinal, é isso que esperamos deles.
A adolescência não molda, ainda assim, a personalidade de Anita – uma menina completamente diferente da irmã, mas que em comum têm os valores transmitidos, que as sustentarão no seu caminho.
A gente esforça sempre a ideia de que é importante respeitar o diferente, de que é importante questionar o “foi sempre assim”. É importante que as nossas filhas se sintam como agentes transformadoras, capazes de mudar as realidades em que elas vivem. É isso que tentamos trabalhar muito com elas. A capacidade de se manterem criativas, de questionar tudo o que está ao nosso redor para criar soluções melhores para problemas antigos.
Marcos define as filhas em linhas parcas, mas fortes, sobre os mundos em que cada uma vive.
A Anita é muito inteligente, extremamente racional, me ensina muito a respeito de tudo, e a Aurora é encantamento puro, acredita em unicórnios, princesas e vive uma vida maravilhosa, colorida como um arco-íris.
Elas gostam de Pop e também de Rock! Ouvem The Beatles, ouvem The Rolling Stones, gostam de MPB (Música Popular Brasileira), Tom Jobim, Elis Regina, e gostam também das músicas que tocam nas rádios. O ultimo hit aqui em casa tem sido aquela música do “Havana Oh Na Na” (canta e ri).
Marcos e Ana não têm ilusões: famílias perfeitas não existem; as felizes sim. A sua felicidade é uma música que toca afinada, que se ouve ao longe, que é bonita e inspiradora. Os segredos são dois. O primeiro é ouvir. O outro é amar.
Ouvir de forma que a gente possa melhorar e criar realmente uma orquestra afinada com todos os instrumentos sendo tocados de uma maneira proactiva.
O “eu te amo” é um contrato que você assina com os seus filhos dizendo “eu estou aqui com você para sempre”. E quando você ouve isso de volta, um “eu te amo” do seu filho você sabe que ele também assinou esse contrato. Isso tem um valor muito grande para fortalecer as relações e manter as famílias unidas.
Inspiração para uma vida melhor (e mais feliz!)
5 inspirações para a vossa vida em família
– Famílias de amigos que permanecem juntos há anos;
– Famílias de viajantes que conseguem estar sempre juntos;
– Famílias que tem baixo nível de consumo;
– Famílias com configurações diferentes das tradicionais e que lutam por igualdade;
– E, claro, mães solteiras (se elas conseguem fazer tudo sozinhas, não podemos reclamar de nada!).
5 músicas para viagens em família
– Águas de Março, de Elis Regina e Tom Jobim.
– Havana, de Camila Cabello.
– Felicidade, de Seu Jorge.
– God’s Plan, de Drake.
– Give Me Love, dos The Beatles.
5 lugares para visitar com crianças
– Tailândia;
– Caribe;
– Fernando de Noronha;
– Florianópolis;
– E, claro, o melhor lugar do mundo: Portugal!
5 livros infantis que todos, pais e filhos, devem ler
– O Livro sem Bonecos;
– A Bola Amarela;
– Pê de Pai;
– Coração de Mãe;
– Hoje Me Sinto.
5 filmes que adoram
– Capitão Fantástico;
– Frozen;
– Divertidamente;
– Os Incríveis;
– Operação Cupido.
Podem encontrar a Família Piangers nos seguintes locais
Instagram de Ana Emília Cardoso
Gostaram de conhecer a família do Marcos, da Ana, da Anita e da Aurora?
Conheçam outras famílias que nos inspiram!
– Família Tomás My Special Baby
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