As novas famílias, os papéis parentais e a depressão são as grandes questões que a Oficina de Psicologia nos explica no artigo deste mês.
Temos assistido a uma evolução da estrutura e características familiares. Dado ao aumento de divórcios, novas famílias se constituem com um emaranhado de papéis: madrastas ou padrastos, enteados, meios-irmãos – filhos dos antigos e novos casamentos dos progenitores – sogros, ex-sogros. Quanto maior o número de casamentos e, consequentemente, de “ex” e de descendentes, maior e mais complexa será a árvore familiar.
Estas novas famílias são confrontadas com necessidades de readaptações constantes e múltiplos desafios. Surgem dificuldades de ajustamento às complexidades e ambiguidades de definição de novos papéis, funções parentais, espaço, tempo, autoridade, disputas de poder, conflitos de lealdade, mágoas passadas não resolvidas, dificuldades de relacionamento entre os novos elementos familiares, dificuldade de sentimento de pertença, confusão na estruturação de identidades pessoais e familiares, reconstrução de rede social, culpa, ciúme, etc,, que podem dar origem a problemas emocionais.
Neste sentido, várias investigações são realizadas para melhor se compreenderem as relações entre parentalidade e bem-estar psicológico e diferenças de géneros; mais especificamente, há estudos que focam os papéis parentais e a depressão.
Se falarmos em parentalidade e depressão, a primeira coisa que as pessoas pensam é na depressão pós-parto das mães, mas ambos, mães e pais, experienciam stress. Em circunstâncias familiares stressantes, a paternidade, por vezes, pode ter um maior impacto sobre a saúde mental.
Especialistas da Universidade de Brigham Young investigaram a forma como os vários tipos de pais experienciam mau-estar psicológico, concluindo que alguns padrastos – com múltiplos papéis familiares – experimentam os níveis mais elevados de stress. Há normas que regem a parentalidade, mas não existem normas para ser um padrasto – “Eu deveria ser um pai real, um amigo, ou um tio porreiro?”
Os pais numa família “os meus, os teus e os nossos” asseguram três papéis parentais: um de cada uma das duas famílias, e de um terceiro, quando uma criança nasce na família reconstituída. Um estudo que envolveu uma amostra de mais de 6.000 pais teve como principal conclusão que o risco de depressão aumenta tanto para homens como para mulheres quando o número de papéis parentais que detêm aumenta.
Mais concretamente, os pais com três papéis eram 57 por cento mais propensos de ficarem deprimidos comparativamente aos progenitores com apenas um único papel parental.
O risco é ainda maior para os pais nas famílias recompostas quando o progenitor tem filhos biológicos que não vivem com ele, uma vez que estão associados os sentimentos de culpa por passar mais tempo com seus novos filhos do que com os seus filhos mais velhos. Mas os investigadores acrescentam que este stress advém do facto de quererem ser um bom pai, um bom padrasto, e um bom novo pai.
As famílias reconstituídas são cada vez mais comuns, logo mais pais sentem o peso de desempenhar múltiplos papéis. Tendo em conta que os pais procuram menos aconselhamento profissional quando precisam comparativamente aos homens sem filhos, estes resultados sublinham a importância de se olhar com mais atenção para este importante elemento familiar.
Para além disso, reforça-se a ideia de que a depressão se pode manifestar de diversas maneiras e que devemos reconhecer que “os pais não são apenas um grupo homogéneo” e que “apresentam sintomas de depressão de formas diferentes do que os não-pais.” Sejam quais forem os modelos e configurações das novas famílias, o foco deverá ser sempre possibilitar que as tarefas e funções parentais sejam desempenhadas de forma adequada para o crescimento e desenvolvimento físico e emocional das crianças e adolescentes.
Raquel Carvalho | Psicóloga Clínica Equipa Mindkiddo – Oficina de Psicologia
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