Desafiar Estereótipos: Educação para a Igualdade de Género e de Oportunidades - Pumpkin.pt

Desafiar Estereótipos: Educação para a Igualdade de Género e de Oportunidades

desafiar estereótipos

O projeto é da autoria de Ana Bacalhau, vocalista dos Deolinda.

Desafiar Estereótipos” é um projecto direccionado para a comunidade escolar, em particular para os/as alunos/as do Ensino Secundário, que explora, para uma melhor compreensão da temática geral, os diversos contextos de vida onde a discriminação em função do género acontece, nomeadamente, na conciliação entre a vida pessoal, familiar e profissional; nos contextos de poder e de tomada de decisão e em casos de violência de género.

Através do livro, de uma performance teatral ou peça de teatro, e de temas musicados por Ana Bacalhau, os jovens poderão reflectir e debater sobre conceitos associados ao tema da igualdade: estereótipos de género; usos do tempo; papéis de género; androcentrismo; empoderamento; capacitação; assédio sexual; entre outros.

O livro, para além de três histórias ficcionadas sobre a igualdade de género e oportunidades inclui também as letras das músicas compostas por Ana Bacalhau para o projecto, capítulos com enquadramento conceptual, exercícios, dados estatísticos, links e contactos úteis.

O projecto “Desafiar Estereótipos” beneficia de uma parceria estratégica com a Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres, que garante a qualidade técnica dos conteúdos explorados.

Todas as instituições que trabalhem com o público-alvo do projecto poderão receber a apresentação do mesmo, tendo sempre incluídas uma performance teatral e uma performance musical de Ana Bacalhau com os temas compostos para “Desafiar Estereótipos“.

No site do Desafiar Estereótipos podem encontrar mais informação sobre o projeto e comprar o livro, bem como entrar em contacto com a equipa de Ana Bacalhau para saber como levar o conceito à vossa escola.

A Pumpkin falou com a Ana sobre este projecto.

A Ana trabalha ativamente para levar a sua voz às crianças um pouco mais velhas. Os debates sobre a desigualdade de género sucedem-se, felizmente, no nosso país, mas ao transportá-lo para o recinto escolar está, quase, a fazer uma intervenção direta na geração futura. Como é que surgiu o projeto “Desafiar Estereótipos“?

Esta ideia surgiu de um convite da Betweien, que está muito habituada a levar a cabo iniciativas educativas sobre todo o tipo de assunto. No entanto, deram-me total liberdade para escolher o tópico de queria eu falar com os alunos.

Tinha que ser um assunto que me dissesse algo – muito! – e do qual eu estivesse à vontade para falar. E sobre as desigualdades de género tenho muita coisa a dizer, e a dizer-lhes, não com o intuito de doutrinar ou de os convencer de alguma coisa, mas com o objetivo de os fazer começar a pensar.

A ideia é que as nossas conversas possam ser uma centelha, um despertar para estas temáticas. É ótimo se eu puder contribuir para esse inicio de pensamento destas gerações que estão entre os 12 e os 18, porque a sua personalidade está a formar-se nesta altura, a postura, a sexualidade e o conhecimento em relação a eles próprios e ao mundo também.

O que a motivou, então, a escolher um assunto como o da violência de género?

É preciso fazer alguma coisa sobre a epidemia de números horríveis, que têm vindo a público, de mulheres mortas e de vítimas de violência doméstica, mas também em relação a notícias sobre pessoas que estudaram uma vida inteira, que deviam ter muito mundo e uma abertura grande, mas que tomam decisões com base em conceitos completamente arcaicos e prejudiciais, que perpetuam o machismo, o patriarcado e a masculinidade tóxica – estou a falar obviamente do juiz Neto de Moura e das suas decisões debatidas na sociedade, mas existem muitos mais casos.

Somos uma sociedade ainda que trata as mulheres como de facto as únicas cuidadoras, não só dos filhos como da casa. O lugar da mulher é em casa… até na música senti muitas vezes que me queriam colocar aí, questionando o meu lugar. Eu não quero ficar em casa, é uma luta minha também, e é por isso que eu também me sinto capacitada para falar um bocadinho sobre este assunto.

Eu sempre me rebelei contra os papéis que me queriam dar, quando me diziam quais os comportamentos que eu devia e não podia ter.

Isto nunca fez sentido para mim. Para mim as pessoas são seres humanos primeiro e têm, por isso, necessidades e direitos iguais. Sendo humanos todos temos direito a sermos livres.

Os números da violência no namoro jovem são alarmantes. É importante tornar esta intervenção ainda mais precoce?

Para já, é muito claro para mim que as pessoas não sabem amar. Não sabem o que é o amor, não fazem ideia. Confundem-no com posse, propriedade, dependência.

E depois há outro problema grave: a saúde mental em Portugal é muito descurada, como infelizmente o é na maior parte dos países. A saúde mental tem influência direta nestas dependências psicológicas em relação ao outro, nestas faltas de auto-estima, de amor próprio e da falha na construção de si por si e não de si com o outro – ou seja, no desenvolvimento da noção de que eu me basto e que o outro não está lá para me completar e sim como parceria.

Como as pessoas veem o outro como uma parte de si, quando o outro se quer libertar não conseguem viver sem essa parte que falta, e por isso é que algumas pessoas tresloucadas quando cometem esses atos tresloucados de violência doméstica costumam dizer frases como “se não és minha não és de mais ninguém”.

Acabar com o estigma da saúde mental em Portugal era importante, combater a ideia de que se vais ao psicólogo és maluquinho, se vais ao psiquiatra ui ui, meu Deus. É um problema muito complexo, que deve ser atacado em muitas frentes, e quanto mais cedo melhor.

E como começar? 

Acho que vivemos num país muito conservador, mesmo muito. Temos que pensar nos valores que as famílias passam… começa por aí. Temos que fazer uma autocrítica. A nós mesmos, à nossa família. É muito difícil, porque a nossa família, para nós e até certa idade, está sempre certa. Mas às vezes não está.

Basta pensar nos conceitos de divisão de tarefas em casa. Se estes miúdos veem o pai “alapado” no sofá e a mãe sempre a “ralar” em casa – acho que são 1h45 a mais que as mulheres portuguesas trabalham em média – claro que o vão achar normal. As crianças adquirem os seus valores através da sua família. Portanto se a mãe faz de empregada doméstica que não é paga…

… esses conceitos têm tendência a ser reproduzidos mais tarde. A Ana tenta por isso mostrar a estes jovens que a sua possível realidade não é a única existente?

Sim, e temos a preocupação de nestas sessões não falarmos apenas no ponto de vista das mulheres. Acredito que o machismo e o patriarcado, a forma como a sociedade vê o homem e a mulher e os papéis que lhes atribui, é tão mau para as mulheres como para os homens, porque os homens também têm que preencher determinados requisitos do que é ser homem que muitas vezes são tóxicos para eles.

Há muitos homens que não se revêem em determinadas características mas a sociedade põe-lhes essa pressão. Muitos homens se calhar gostavam de estar mais tempo em casa com os filhos, só que depois os amigos e os familiares… direccionam-nos, exigem-lhes outras atitudes.

Também se diz que os homens não podem expressar-se emocionalmente e que não têm jeito para emoções. É treta. Isso não tem nada a ver com o facto de eles terem nascido homens e sim com como foi feita a sua socialização em criança.

As miúdas são estimuladas a falar sobre os seus sentimentos e os miúdos são estimulados a não falar sobre os seus sentimentos, portanto é natural que não tenham adquirido essa competência enquanto adultos.

A nossa ideia também é trabalhar para libertar os homens e fazer com que na cabeça destes adolescentes eles pensem: “Epá, pois é, querem que que eu seja assim e assado, que me vista assim e reaja assim, mas eu não me sinto confortável, não sou assim nem tenho que o ser”.

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